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31.12.06

Aracaju [Sergipe] (20/12/06)

E havia uma ponte. Enorme. Dessas de filme, imponentes, atirantadas, sobre o rio. E não havia balsa coisa nenhuma nesse trecho. Não mais. Era uma ponte megalomaníaca, na estante de algum candidato para as eleições... E chegamos como quem chega no desconhecido. Era mesmo um mistério: a cidade, o Estado, o lar da vez. Sabíamos pouco acerca do lugar e também acerca das pessoas.

Perder-se foi inevitável. Mais uma vez, à procura do endereço, ruas adversas do imaginário e memória nenhuma de lugar, tínhamos uma orientação para quem chega por um caminho diferente do que seguimos. Mas, enfim, encontramos o paradeiro de mais um querido. Pouso farto de acolhida e serenidade.

Acomodados, sabíamos que a temporada seria breve. O Natal estava às beiras do tempo, não podíamos incomodar. E aproveitamos de modo cheio: logo de noite fomos à casa da avó de nosso anfitrião, comemos cuscuz com sardinha, receita de seu pai. Inusitado e saboroso. Mesmo para nós, nordestinos, a combinação foi novidade.

No dia seguinte, entre conversas acerca daquela realidade, ainda fomos conhecer a cidade, sob olhar de um arquiteto local – nosso acolhedor é colega de profissão, da primeira turma formada na cidade, e ainda de movimento estudantil. Caminhamos pela orla, pelo rio; a importância dele por todos os cantos, sobretudo da ponte, a tal ponte monumental e iluminada.

Muitas impressões colhidas, das pessoas, do ritmo particular, a dinâmica social, jeito de interior e de cidade querendo crescer, metrópole latente, povo na puberdade, uma valorização rara da qualidade de vida, sentida por onde andamos. Pode ser equívoco, mas estas impressões eram comprovadas a cada instante. Do mesmo modo que sentimos a influência grande da Bahia, fato histórico, é verdade, pois muitos serviços vinham dali. Mas muito psicológico: a presença da Bahia é como de uma mãe, vai guiando em costumes e desenhos urbanos, transita de uma jeito ou de outro.

Na escala do lar, o sentimento foi parecido: nosso acolhedor trabalha com forte intercâmbio baiano, festas no sul da Bahia, inclusive, estava ajudando a organizar para o reveillon. A família tem ascendência russa, interessantíssimo, mas a relação com o estado vizinho ainda supera, no que concerne às tradições, modos de viver...


Agradecimentos:
Ao Seu Benjamim, por ceder seu quarto, pelo carinho e pela sardinha com cuscuz;
À Paula, pelos quitutes e receptividade;
À Érika, pelo sorriso perene, serenidade e pelos biscoitos saborosíssimos;
Ao Vich, pela generosidade constante, abraço apertado e permitir-nos o prazer de conhecermos a família Schuster, de fina delicadeza e hospitalidade.

[E mais uma vez, a lição dos sentimentos:
a intensidade é que permite a emoção,
independe de tempo, exige apenas do coração;
coisa d’alma, de se permitir a outro ser humano,
mesmo que há pouco conhecido...]


bem vindos à Aracaju
konidomo

Érica
konidomo

produção de Érica
konidomo

Seu Benjamim
konidomo

Paula
konidomo

percurso urbano
konidomo

a escala e a dicotomia
konidomo

Vich e a Cidade
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Centro repaginado
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a desinibida de Aracaju
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a árvore de oitenta e seis metros (e quatro centímetros)
konidomo
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26.12.06

Penedo (19/12/06)

Já que havíamos parado em uma pousada, resolvemos economizar com o jantar... Levamos a estrutura para o quarto: fogareiro e panelas. Fizemos uma sopa, pela nutrição e limpeza da estrada, pela economia e aconchego do alimento. Dormimos rápido. Estávamos em belo local na cidade, em frente à praça, havia até um coreto.

De manhã, comemos e passeamos, cidade linda, impregnação da história. E fomos até o RIO, colocar os pés : emoção de quem se sente brasileiro, que dirá nordestino...

Pelas ruas, casas antigas, muitas Igrejas, feira de verduras e carnes. Desenho apenas, muito na vista, ouro na história – por dentro das Igrejas – falar com nativos, saber dos tempos, enquanto porto, enquanto divisa... Arrumamos as coisas e seguimos, pela balsa, para o outro lado, lá do outro lado já era Sergipe...

[coisa linda é dividir o rio São Francisco, cada margem para um Estado, Algoas e Sergipe, além de outros pedaços pelo país]

coreto no natal
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tocar o Chico
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o Rio e a Cidade
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secular
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o poder da fé
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por dentro
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reparando
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desenhando
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primeiro plano
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Papai Noel tirador de onda
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balsa sobre o Rio São Francisco
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estrada rumo Sergipe (19/12/06)

Alagoas é cheiro de melaço, na estrada e às vezes na cidade. Vimos canaviais e sentimos que estávamos abandonando o Estado quando isso se tornou rarefeito. E apenas paramos numa cidadezinha, por conta da fome. Nossa farofa de carne de sol havia mofado...

Paramos em Coruripe, na Praça dos quiosques e fomos à 'barraca de Belém' – assim se chamava o lugar onde compramos pão com ovo e complementos.

A partir de então, estávamos obstinados a seguir o Rio São Francisco, à procura de sua Foz. Entramos várias vezes em cidades, orientados por indicações de placas. Acabávamos voltando, pois sempre aparecia alguém para dissuadir, já que a estrada estava sem acesso.

[Anjos, aparecem no caminho e conduzem, é ciência de peregrinos, quem não crê nos instintos, leva balão na estrada...]

Finalmente encontramos o 'Chico' em Piaçabuçu, cidade de valor histórico e geográfico, só indo lá para ver, para sentir... Seguimos em frente e paramos em Penedo, já era noite, denúncia de ficar, ver melhor no outro dia, com a luz do sol.



tentando chegar à Foz
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tecnologias criativas
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encontrando o Velho Chico em Piaçabuçu
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ir X partir ( 19 /12 / 06)

E ir é fluir.
E partir é romper.

A gente se perde nas palavras, quando vai contar uma história. Como conter nelas o etéreo das coisas?
Não queremos romper, deixar partida a lembrança. Queremos ir, como rios e chuvas, dar um abraço de fechamento, não de despedida. Ter certeza de rever um dia, ouvir falar, dos carinhos, dos encantos...

Aprender a ir é o mais difícil, a gente comprova isso todas as vezes.

E no dia de ir, foi tanta tentação para ficar, que acabamos sentindo mais forte a intuição de seguir. Apesar do almoço de Dona Carmó. Apesar da proposta de Alice, ainda incerta é verdade, de entrevista no jornal onde trabalhava. Apesar da visita carinhosa que recebemos dos recém amigos descobertos. Apesar dos apesares, como se diz (e jamais dos pesares). A gente foi. Assim, aparentemente de súbito e inexplicavelmente, para os outros. Mas fomos de coração, nem partido, nem contido. O coração foi aberto, doido pela estrada, doido de saudade, mas livre, como há de ser.

[agradecimentos:
· À dona Carmocila e Vanessa, pela acolhida e iguarias, além das trocas, de conversas a interpretações de mundo, contribuindo, assim, para nossa pesquisa e nosso crescimento humano;
· À Alice Jardim, por nos apresentar um belo lugar - o Oiteiro - objeto de seu trabalho de graduação, recebendo-nos em sua casa e dividindo conhecimentos acerca da Deriva. Somos igualmente gratos a sua iniciatia de publicação do trabalho, embora tenhamos decidido partir: o mais importante são os instintos, a fluidez do projeto e não apenas a divulgação dele, quando isto mesmo pode comprometê-lo.
Agradecemos também, nesse ínterim, ao Augusto, que foi junto conosco, pelo almoço e momentos na praia;
· Aos queridos amigos da Vanessa, que estavam no Babassom, (não sabemos se a ortografia está correta), pela noite, conversas e etc;
· Aos queridos da UFAL, em especial, Eduardo, Carlota e Mexicano;
· Ao Seu Eloy, por nos possibilitar momentos no seu espaço, no Under the bridge, bem como pela ‘saideira’ por conta da casa.



até breve [Julio, Raquel, Eduardo, O Mexicano, Carlota e David]
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under the bridge ( 18 /12 / 06)

Embaixo da ponte. Perto da Ufal.
A gente foi na Universidade, respirar ar estudantil...
E como os estudantes, sentimos necessidade de respirar outros ares (perto da Ufal há o ‘Cadeião’, uma espécie de presídio provisório, pelo que nos informaram e há , como é mais comum a outras universidades um barzinho simples).ntão, fomos ao Under the bridge, um bar sob um viaduto, bem freqüentado pela comunidade acadêmica e vizinha . Conhecemos muitos do lugar: amigos de nossa acolhedora, pessoas que ali apareceram e o proprietário (Seu Eloy).

A noite começou pela tarde e terminou pela manhã... Muitos queridos, como de costume. Ficamos com a impressão de que não é preciso fazer esforço para conhecer pessoas incríveis. O universo encarrega-se disso... Só nos resta agradecer...
[a caminho da tarde inesperada e noite encantada, do rádio do Fusca, escutamos incisivo mais um som alucinado do conterrâneo Belchior]
Alucinação
Belchior
Composição: Belchior

Eu não estou interessado em nenhuma teoria,
Em nenhuma fantasia, nem no algo mais
Nem em tinta pro meu rosto ou oba oba, ou melodia
Para acompanhar bocejos, sonhos matinais
Eu não estou interessado em nenhuma teoria,
Nem nessas coisas do oriente, romances astrais
A minha alucinação é suportar o dia-a-dia,
E meu delírio é a experiência com coisas reais
Um preto, um pobre, um estudante, uma mulher sozinha
Blue jeans e motocicletas, pessoas cinzas normais
Garotas dentro da noite, revólver: cheira cachorro
Os humilhados do parque com os seus jornais
Carneiros, mesa, trabalho, meu corpo que cai do oitavo andar
E a solidão das pessoas dessas capitais
A violência da noite, o movimento do tráfego
Um rapaz delicado e alegre que canta e requebra, é demais
Cravos, espinhas no rosto, Rock, Hot Dog, "play it cool, Baby
"Doze Jovens Coloridos, dois Policiais
Cumprindo o seu (maldito)duro dever e defendendo o seu amor e nossa vida
Cumprindo o seu (maldito)duro dever e defendendo o seu amor e nossa vida
Mas eu não estou interessado em nenhuma teoria, em nenhuma fantasia, nem no algo mais
Longe o profeta do terror que a laranja mecânica anuncia
Amar e mudar as coisas me interessa mais
Amar e mudar as coisas, amar e mudar as coisas me interessa mais
Um preto, um pobre, um estudante, uma mulher sozinha
Blue jeans e motocicletas, pessoas cinzas normais
Garotas dentro da noite, revólver: cheira cachorro
Os humilhados do parque com os seus jornais
Carneiros, mesa, trabalho, meu corpo que cai do oitavo andar
E a solidão das pessoas dessas capitais
A violência da noite, o movimento do tráfego
Um rapaz delicado e alegre que canta e requebra, é demais
Cravos, espinhas no rosto, Rock, Hot Dog, "play it cool, Baby"
Doze Jovens Coloridos, dois Policiais
Cumprindo o seu (maldito)duro dever e defendendo o seu amor e nossa vida
Cumprindo o seu (maldito)duro dever e defendendo o seu amor e nossa vida
Mas eu não estou interessado em nenhuma teoria,
Em nenhuma fantasia, nem no algo mais
Longe o profeta do terror que a laranja mecânica anuncia
Amar e mudar as coisas me interessa mais
Amar e mudar as coisas, amar e mudar as coisas me interessa mais
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18.12.06

São Miguel dos Milagres [Oiteiro] (17/12/06)

E mesmo assim, havia um plano para o domingo. E seria logo cedo. Isso quer dizer que deitamos por algumas horas apenas, duas ou três e despertamos, estava combinada a ida ao Oiteiro. Acabamos pegando o ônibus sozinhos – pois nossa acolhedora não sentia-se bem e resolveu ficar – orientados no ponto de parada por Dona Carmocila (Dona da Casa e mãe da Vanessa), toda preocupada, feito mãe que deixa criança para ir para o colégio. Além do que, nos muniu de comidas: macarrão, sardinha, biscoitos, milho, ervilha, abacaxi cortado, melão... E então descemos no lugar combinado, a menina já estava a nossa espera.

Uma estudante de arquitetura e urbanismo que conhecemos estava com um trabalho de graduação no lugar, São Miguel dos Milagres. Além da pesquisa dela, sua família possuía casa na localidade. E ela nos levou até lá. Pois é, desses lugares ridículos de tão belos, caricatos até. Coqueiros, mar sereno, sol posicionado em equilíbrio, para não ofender os desenhos da paisagem. Logo na estrada era de se ver: cortina de coqueiros, ao molde de um código de barras, bem paralelos na tapeação da vista, mas desordenados, do jeito da natureza. E por trás, aquele mar em tons: verdinho claro, verde escuro (o redundante verde-mar), azuis, lilás.

De inusitado, havia uma estátua de Padre Cícero numa das praias vizinhas – na Barra do Camaragibe - e uma sereia ilhada à beira do mar. Passamos o dia no lugar e voltamos na manhã seguinte.



chegada
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boca do rio
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mirante
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código de barras
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tecnologias
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tecnologia nordestina
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menino da praia
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sempre na cozinha
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nada mal [Alice, a dona da casa e Augusto]
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depois do almoço
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na praia
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clichê
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preparos noturnos
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passeio noturno (16/12/06)

E foi de noite que resolvemos ganhar escala urbana. Descemos, como aqui dizem, já que onde estávamos ficava ao alto, na topografia da cidade. Pegamos um ônibus, se não falha a memória o nome era ‘Eustáquio/Ponta Verde’, ou algo parecido. E cortamos, com ele, vários bairros e conjuntos.

A casa fica no bairro Tabuleiro e neste são contemplados alguns conjuntos, como Eustáquio Gomes e Salvador Lira. Segundo nossa guia, nativa do lugar, foram projetados para desafogar a densidade do Bairro vizinho, Jacintinho. Depois de passarmos por ele, inclusive, abriu-se um visual inacreditável, que para nós foi bem esclarecedor. A informação da topografia foi sentida e contemplada, deixando de ser apenas imaginário. Estávamos então na Serraria, que é uma espécie de bairro de transição entre os bairros altos e baixos. Daí, mais adiante, já estávamos no Poço, bairro com histórico de insegurança pela noite e então, depois de vermos várias sedes de 'Igrejas Universais' e ‘Assembléias de Deus’, passamos pelo Jaraguá, um alívio para os olhos, posto que era um bairro histórico. Ficava perto da praia e este abriu-se em vista ao passarmos por Pajuçara, área nobre e, depois, por Ponta verde.

Quando descemos, encontramos alguns colegas da profissão. Transitamos em vários assuntos e depois de muita falação, o sol alertou a hora e voltamos, enfim, para casa.
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lar da Dona Carmocila (16/12/06)

E mal acordamos percebemos várias particularidades. Quantas panelas. Nunca vi tantas numa casa. Até no quintal. E todas em excelente estado. De todos os tipos: vidro, ágata, inox, teflon... Dentre todas, ficamos intrigados com uma em especial: chamava-se, segundo a Dona da casa, ‘vigorosa’. Era uma espécie de vaporeira vazada ao centro, onde assava-se pães, carnes, o que quisesse.

A casa é bem comprida, grande, sobretudo para apenas duas moradoras e trânsito de duas trabalhadoras. Isso mesmo, uma casa eminentemente feminina. Mas, apesar disso, sem a leitura de vulnerabilidade, muito ao contrário, as personalidades imperantes são fortes e independentes. De masculino, há um cachorro e as visitas dos filhos. Na ocasião um deles até estava presente, pintando a casa do lado de fora.

E até fomos para a calçada depois do café. Agradável na rua, sentamos e conversando por um bocado.



conversas de calçada
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reparando no jardim
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falando da rotina
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Dona Carmó falando da casa
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procurando o abrigo (15/12/06)

Não basta chegar à cidade, há de entendê-la e revirá-la. Pois bem, a primeira perdida é sempre à procura do abrigo e nesse ponto, somos também animais. Buscamos a casa de nossa acolhedora (é um termo bem mais interessante que anfitriã, por uma infinidade de motivos) que ficava próxima à UFAL – Universidade Federal de Alagoas. Morava em Eustáquio Gomes, um conjunto da COHAB, inaugurado em 1981. Como é típico desse tipo de organização, as ruas são bem parecidas e a identificação é às vezes difícil. Assim, fomos esperados na esquina de sua rua, logo vimos duas figuras femininas, ao nosso encontro.
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estrada rumo Maceió (15/12/06)

Antes de chegarmos à próxima parada, ‘curiamos’ uma cidadezinha, no caminho. Chamava-se São José da Coroa Grande e achamos engraçado o nome. Há tantas localidades no mapa, que ficamos às vezes intrigados com a criatividade (e por vezes esquisitice) de seus nomes. Alguns, com charme especial, beleza e atrativos no título, não correspondem fisicamente. Outros, ao que não se dá muito, apresentam-se como verdadeiros paraísos anônimos. Na dúvida, entramos em São José da Coroa Grande, imaginando como seria; luzes e pessoas. E a cidade é uma graça. Depois ficamos sabendo que alguns filmes foram gravados lá, cenas famosas e tudo mais.

Mais à frente, já havendo anoitecido, pensamos em parar para passarmos a noite. Em Maragogi, acreditando que haveria mais alternativas, até encontramos um lugar razoável. Mas nossa amiga de Maceió estimulou-nos a seguirmos, para que chegássemos logo a sua casa.

E decididos a enfrentar as curvas da rota litorânea – lamentamos ter escurecido, apenas ouvíamos a presença do mar – fomos com cuidado. Vez e outra alguns pingos da chuva vinham como asteriscos contra nós. E vimos queimadas de cana, barracas de palha a abrigar ‘sem terras’, usinas com toda a imensidão e opressão possíveis. Sentimos cheiro de melaço em quase todo o percurso, dentre os morros e infinitas plantações de cana. Já a sustentar o cansaço e resistir às chuviscadas chegamos, enfim (e como foi aliviante), à Maceió.
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soldados?

Pouco mais além, na boca da BR, avistamos uma bandeira do Brasil. Gigante como a sua natureza. E lembramos de nossa pieguice toda, um papo sobre soldados, sobre pátrias, sobre esse amor de filho avassalador. Quem o tem? E quem são os verdadeiros soldados? Os exércitos? Por conta do histórico de sangue em eventos internos e externos das Nações tendemos a repudiar as fardas, a ordem imposta pelas organizações da espécie. Entretanto, a natureza dessas instituições e como elas interpretaram a defesa das Pátrias é que beira absurdos e equívocos. Não devia ter como base o ódio e sequer a guerra como fim e objetivo de treinamento. Patriotismo não significa honrar a nação em detrimento de outra, mas amar, zelar, no que concerne o meio, social e ambiental. Ser patriota é muito mais proteger o outro das agruras, das intempéries, das misérias; é mais cuidar da paisagem natural; atuar com ética nas diversas profissões em benefício do país, dentre outras manifestações de benquerença, amor, amor sempre. E no caminho nos perguntamos isso, graças a um boné do exército presenteado por Seu Carvalho. Quem são os verdadeiros soldados? E, em sendo assim, que armas portam, que lutam travam e o que buscam? Quem, como e o que? E temos certeza de alguém haverá de reprimir o objeto, assim simplista, como se representasse tudo. E com o mesmo ódio, agir, discriminar e se opor. Na mesma língua.
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dos filhos deste solo (15/12/06)

Somos fruto do ecletismo, isso sim. A mestiçagem nem é só de cor, nem de cultura. É mais. A gente, por exemplo, acredita numas coisas, funde com outras crenças, não aprecia muito doutrinas, mas também reza. E se comunica com o universo. Usa escapulário desde que Jorginho nos abençoou em Tibau. Sabe decorado a Pai nosso, a Ave Maria e Credo, graças ao catecismo, ligeiramente coagido. Respeitamos, embora não façamos parte de religião alguma específica. E assim, no pé das estradas, antes de ganhar as vias, falamos com Deus. Um transe íntimo, conversa em pensamento, sem raciocínio ou texto padrão, sem reza feita, essas coisas. A gente fala de coração.

Antes de toda a gincana para sairmos de Recife, ao sairmos no carro, fomos banhados por brilhos inexplicáveis. Cor de prata, bem na nossa frente, dentro do Fusca. Não fosse o encantamento, o discernimento acabaria com todo o romantismo, ao descobrirmos que era obra do pó de grafite, usado pouco antes. Mas melhor era crer na benção divina, na presença celestial de nossos amigos, anjos companheiros de viagem... Purpurina reluzente ao sol, cheio de graça.
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dia de ir (15/12/06)

E ainda havia um mundo a resolver... Não bastasse ter dormido tarde, fazendo backup dos dados de Recife, era preciso acordar cedo para dar conta das pendências e pegar a estrada o mais cedo possível.

Enquanto um arrumava todas as coisas no fusca, alguém precisava imprimir ‘los comentários reales’ de Garcilaso de la Vega, documento acerca dos primórdios da cultura peruana, antes e durante a colonização espanhola. Era imprescindível, fazia parte da lista do que não podia deixar de ser feito. E é óbvio que a tinta acabou, pois o que sentimos muito em nossa estadia foi muita dificuldade em realizar, um fluxo sempre lento, interditado, entravado, entraves, entr... Assim, o jeito foi desencanar, imprimir no modo mais lento, o qual permitia ainda alguma cor. Enfim, meio-dia o texto ficou pronto e a arrumação também. Faltava ainda passar em alguns lugares importantes.

A primeira providencia foi ir à oficina, para um último ajuste na direção. Tarcísio estava lá e olhou pessoalmente. De lá, partimos para a história do adesivo do KONIDOMO, finalmente.

No dia anterior, havíamos encontrado um velho amigo de Júlio, ao qual havíamos emprestado um livro. E ele insistiu, desde que chegamos em Recife, para que entrássemos em contato com uma gráfica de um conhecido. A idéia era fazermos um vinil para o carro, identificando a expedição. Era ótimo, já tínhamos pensado nisso. Mas, até então, nem tinha dado tempo, nem havia aparecido oportunidade (no que tange dinheiro e oferta). Então, mesmo assoberbados de afazeres e em dia de viagem, acabamos passando na IDENTIFIX, gráfica que trabalha com vinis e aplicação deles. Foi até emocionante quando pregamos no vidro do carro e ficou uma graça...

Depois disso, ainda precisávamos passar no Sossego para fecharmos uns detalhes. Só depois de toda essa jornada, contando já com a tarde avançada, fomos para a estrada, rumo Maceió.


Agradecimentos:
Ao Distéfano, por canalizar a gráfica e pensar em várias idéias interessantes, além do carinho;
A Identifix, por fornecer o adesivo de vinil para o Fusca, além de aplicá-lo, rápida e eficientemente;
Ao Seu Carvalho e A Dona Teresa, pela hospedagem e contribuições fundamentais para a viagem (sobretudo pela farofa de carne de sol)

E, nesse íterim, aproveitamos também para agradecer:

À Dona Carli e Seu Paulo, por motivos afins, verdadeiros apoiadores, antes e durante, acreditando sempre e contribuindo com nosso Projeto.
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[acerca das despedidas] (14/12/06)

Ir é deixar-se;
largar a pele.

E reconstruí-la depois.
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como coisas de Caio Fernando Abreu (14/12/06)

E ele disse: espera secar no pé, fica assim como está – e mostrou a semente de helicônia – muito sol. Para lugares de estações, o melhor é plantar no verão. E ela disse: ele é hermético, explica com todos os detalhes e entrelinhas... E com isso, ele continuou: são mini-bananeiras. Dá mais de um olho. Cada olho, uma flor. Cada flor, uma mamona. Cada mamona, milhões de sementes. Depende do tamanho... E ela sorriu, como o sol que era. Cabelos na cintura. Pareciam os textos lidos sentidos transpirados, como coisas de Caio Fernando Abreu. Morangos em vasos sanitários? Ele contou sobre uma crítica no jornal, acerca de uma exposição ou algo do gênero, ao lembrarmos de Morangos Mofados. E olhou-se para o saco de sementes: não lembramos de onde partiu a idéia, ¼ de cada, talvez, um pedaço de cada um. Até ficar meio inteiro: deixar uma semente em cada lar adentrado. Não fosse só bonito e metafórico, era ainda uma idéia fértil. E ele ou ele ou ela ou ela disse: cada pessoa vai ficar com uma flor. E quem não disse, imaginou no exato instante. E, encantada, ela disse: que sobre uma para o nosso jardim. E ela, ensolarada, com olho de amor respondeu: se a estrada é o lar de vocês agora, terão um jardim em cada canto da América do Sul. Passou um anjo, naquele segundo. E ele sorriu. E sorrimos todos juntos.
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métodos, computadores e números (14/12/06)

Esta história da importância de ferramentas básicas acabou comprovada para nós. É óbvio que temos que fazer com o que temos, mas o desgaste e a dificuldade às vezes são sem tamanho.

Tínhamos 4 giga de bagagem virtual, criada apenas em Recife, dentre fotografias e textos, comunicação visual, espécies de várias naturezas. A depender das gentilezas das pessoas, por vezes nos deparamos com limitações. Nesse caso, o computador nem lia DVD, nem gravava sequer CD. Como fazer o backup? Uma ciência.

A primeira idéia foi tentar arrumar emprestada uma pen-drive, ou um cartão de memória. Com este plano, conseguimos um amigo que cedeu sua câmera como ferramenta de transferência. Acontece que tal mecanismo permitia o armazenamento de apenas 1 giga de memória. Assim, seriam necessárias 4 viagens de modo a vencer todo o conteúdo. Se já era desgastante o método, nem sequer pôde ser iniciado. Nosso amigo comunicou, ao chegar um de nós lá, que a máquina dera pane, algum problema desses que acontecem inexplicavelmente. Sem êxito.

A segunda idéia foi checar com um vizinho. Aparentemente ele possuía todos os artifícios necessários. Entretanto, quando chegou em casa do trabalho, além de cansado, não possuía meio de transporte para os arquivos. Plano B descartado.

A última tentativa partiu da oferta de outro amigo. E já passava das dez da noite. Levamos para tanto, o próprio HD, a fim de instalá-lo como ‘escravo’ na CPU oferecida. E foi o que deu certo.

Além das produções de trânsito levamos conosco todo o conteúdo de nossa máquina vendida – nas vésperas da viagem. As variações de transtornos são tantas que já estamos criativos! E não vemos a hora de acabarmos com isso, ao adquirirmos o tal do laptop... E desse modo, poder observar mais, registrar mais, perder menos tempo com tecnologia, incomodar menos as pessoas e poder dar mais atenção aos acontecimentos, aos movimentos, às gentes, aos lugares.

[Nesse íterim, compete-nos agradecer:
ao Felipe Araújo, por canalizar nosso projeto na mídia, através do Jornal o Povo (bem como a repórter Rosa Sá, que realizou a matéria) no que explicitava nossa necessidade de apoio para a aquisição destes equipamentos;
à Lívia Vieira, amiga e colega da profissão que comprou nossa máquina, ainda em Fortaleza, ajudando com isso na verba para a viagem;
ao Leo Bandeira por oferecer seus equipamentos, mesmo não dando certo e sobretudo por nos ajudar com o site, fazendo a versão em html;
ao Seu Carvalho, por disponibilizar sua máquina e impressões, sempre que necessário para a produção do KONIDOMO em Recife;
ao Dr. Paulo, por ceder também seu computador e periféricos, quando em Fortaleza;
ao Sargento (vizinho de Seu Carvalho), por oferecer seus préstimos em casa e no trabalho;
ao Carlos Henrique (Cego ou Carlota, para os amigos) e sua namorada Carol a ele (e a sua mãe também, por ser a proprietária) por permitir todo o mecanismo final, abrir sua máquina, ceder suas ferramentas, tarde da noite, com toda a paciência. E, ainda, por nos presentear com fitas cassetes de vários gêneros para a viagem, as sementes e a idéia de distribuí-las. E agradecemos aos dois, principalmente, pela gentileza com que fizeram cada uma dessas coisas, sem metades e abraços cheios.]
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13.12.06

caminhos (13/12/06)

Estamos na iminência da partida. Outra vez. E como da outra vez, vamos deixar uma família para trás. Acenando, chorando e sorrindo. E como da outra vez, estamos enlouquecidos com tantos afazeres, acertos finais, imprevistos inimagináveis [até prova de renovação de carteira fez-se, Júlio errou só uma questão, de 30, bom para quem vai pegar estrada...] feitios, feitios, sono... Como da outra vez, estamos também com infinitas possibilidades. Caminhos. Tantas questões... Mar? Sertão? Nem é aí que permeiam nossas dúvidas. Todo lugar é interessante por natureza, por sua natureza. E, sobretudo, pelas pessoas. Sempre há um adverso, um peculiar interessante a se ver e se intrigar. Não por isso. Temos sede de ir, conhecer, desbravar. Mas dentre todas as minúcias a se elencar (somos livres, mas não temos apoio nem patrocínio, precisamos nos planejara cada trecho... ), há, além das relevâncias financeiras, as da natureza (está chovendo muito em alguns lugares) e, principalmente, as da intuição. Algo nos diz... Há uma Bahia inteira a se vencer – e ver, conhecer, provar -, um Sergipe acanhado, cheio de mistérios, uma Alagoas anacrônica, que ora chama, ora se cala. Há um Espírito Santo magoado por não o prevermos no percurso, de canto, competindo com as rotas pelo sertão... Há Tocantins, pulsando, enchendo a boca d’água, impresso em textos, incitando, curiando, mas sem respostas, mudo (enviamos muitas cartas para Instituições , Governo, Imprensa, solicitando apoio, pelo menos de abrigo e não obtivemos retorno) e ainda estamos insistindo, pelo fetiche. Há Minas, em ouro e gente, lugares mágicos, como São Thomé das Letras... Goiás, Rio, São Paulo e tantos, e tantos outros que estão pelos cantos, não nos parece caminho, embora o caminho seja traçado por nós... Perder-se no Brasil é fácil. Tudo há, já diziam nossos colonizadores. Mas a questão é: o que diziam os outros colonizadores? Ainda temos um continente a ir. Se tivéssemos todos os recursos financeiros demandados, se tívessemos ao menos equipamentos básicos, como gps e laptop... Pois façamos como nos há, com o que temos e dentro das possibilidades. E assim, desejamos que os caminhos se abram. E sejam sempre caminhos, posto que em qualquer viagem, o caminho é que é a própria viagem. É o que enche o texto, o retrato e a recordação. São os caminhos que nos alimentam, como artérias da terra, veias e vasos; jorrando mundos, como se jorra sangue, como o pó que somos, depois e antes, de barro.
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dia do arquiteto e do engenheiro e do agrônomo (11.12.06)

fazer parte do sistema CONFEA-CREA é como ser trigêmeo: até o dia é dividido!

Aos colegas da profissão, um dia para refletir acerca de nossas habilidades e o que temos feito...
Aos colegas do Crea, engenheiros e agronômos, felicitações pela data, que sirva também para suas respectivas tormentas profissionais...

Mas que sempre sejam supremas as felicidades de sermos o que somos, arquitetos-urbanistas, engenheiros, agrônomos. Quem inventou essa estúpida rivalidade (sobretudo entre arquitetos e engenheiros) apenas está longe de compreender que nada somos um sem o outro, assim como as profissões próximas, fazemos parte de uma cadeia que se complementa e que quando assim entende, alcança o sublime...

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a gente vê o pensamento fixo (09/12/06)

E num foi que resolvemos desacelerar um pouco... Muita informação, dedo no gatilho o tempo todo, fotos, fotos, fotos, textos, textos, textos....

É lógico que mesmo assim, a cabeça não pára, continua, continua...

Resolvemos ver um filme, alugamos um dvd, para sairmos da obsessão. É sempre bom relaxar e são exatamente nessas pausas que acontecem os melhores starts... Sensacional.

Assistimos “carros” – nem assim nos livramos do tema, embora fique aqui um protesto pois NÃO HAVIA NENHUM FUSCA NO FILME!

Pois bem, fomos pegos em cheio com este pensamento da história: como detalhes da modernização, coisas que não imaginamos podem acarretar em (realmente) sérios fins... Não vamos falar do filme, não é essa a questão, mas dos tempos: a paranóia de ganhar tempo, não olhar para os lados, sequer sentir o sol arder no braço repousado na porta do carro... O que se apreende? Asfalto na frente, asfalto pelo retrovisor. Às vezes é automático, todo mundo faz assim, todo mundo, todo o mundo... Será possível que TODO O MUNDO está na mesma fixação?

Há paisagens maravilhosas ao lado. Sempre há. É só virar um pouco a cabeça...

[a curva e a reta: um duelo crônico da modernidade – com grandes desvantagens para a serpente]

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feriado no sossego (08/12/06)

Enquanto Tod.é arrumava o depósito, cozinhamos. A casa encheu-se de gente, nem estávamos preparados para cozinhar, enfim. Improvisos, carne de sol, sururu, mangas flambadas no conhaque... Temos que admitir que não saiu tão bom quanto desejávamos, pela auto-critica exacerbada que nos é inerente, porém, barriga cheia, na medida das possibilidades, na medida do que é para ser e do que foi. E pronto!

[gentilezas são flores do coração]


arrumação [tod.é , Henrique (moradores da casa) e Júlio]
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Anaïs montando sua cama
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reencontro de Moa e Ataulfo
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preparativos para o jantar
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na cozinha [Daniela Brilhante e Olga (moradora da Casa)]
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Lucas - fotógrafo e amigo dos moradores
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Menor casa [Menopausa] de Olinda (07/12/06)

Tempos férteis e produtivos. Depois do dia instrutivo e bastante propício à reflexão, fomos para uma nova fonte, de modo a conhecer a Menor Casa de Olinda. Era lá em Olinda (como o nome diz) e estava havendo uma exposição (mais uma!). Havia muita gente interessante, boa conversa, boa arquitetura, bons ares. O clichê de Olinda: ruas charmosas, gente de todo canto que ficou por lá. A casa era ainda mais surpreendente que todo o entorno: uma casa mínima de espaço mais máxima em expressão. Um triângulo, restos de loteamento (quem sabe?), minimalista em extremo, economia de espaço e aproveitamento absurdo de cada canto. Um esbaldamento para arquitetos, uma lição para projetos. Era uma casa, antes, mas agora funciona como apoio, ateliê, espaço para mostras. Tão pequena que é básica e múltipla, difícil assimilar, fácil de ver, plantas e céu até, surpresas em toda parte.

[proprietários: Fernando e Irma]

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Ilha de Deus (07/12/06)

Se fosse o óbvio, já seria uma ilha... E é uma Ilha de verdade: cercada de água por todos os lados e acessada por uma ponte sobre palafitas.

O mesmo oficiante nos levou lá. A Ilha de Deus é uma comunidade à beira do Mangue, formada por casas em alvenaria, barracos sobre terra e outros sobre palafitas.

Entrar é ver um mundo real e não fictício. É ver sem lentes, por si mesmo e não como imprimem nos jornais: condição que se quer expor e se fazer acreditar. È sim, não há como negar, precária e de difícil acesso. Mas o que se vê - e vamos aos filtros de Tod.é: a gente vê como feio ou bonito, problema ou fonte de demandas e muito a fazer– é uma condição de vida particular, adversa, muito da geografia e da relação homem-natureza. Uma riqueza de ecossistema: o mangue e suas ofertas naturais, as intervenções humanas e a relação com o ambiente.

Atravessamos a ponte sobre palafitas, ora firme, ora frágil e chegamos ao pedaço de terra solta, a Ilha. Andamos pelas ruas com escala de gente (pedestres e ciclistas), tortuosas e estreitas, em terra. E chegamos ao ‘Caranguejouçá’ : local onde acontecem oficinas, curso de Fotografia, rádio comunitária e ainda aguarda a chegada de computadores para utilização dos moradores. Um lugar concentrador de possibilidades e efervescência.
Pois bem, lá, encontramos dois atuantes, conhecidos de nosso amigo. Falaram do espaço, das atividades realizadas e idealizadas. Nos levaram de barco aos viveiros e tivemos oportunidade de conhecer inovações técnicas, além da riqueza do lugar, desde paisagem a pessoas, pelo mangue e pelas palavras trocadas.

Nos limites entre terra e água, estão colocando mariscos de modo a aumentar a área da Ilha. Assim, para pegarmos o barco, andamos por cascas, como que uma transição entre areia e água. Nos viveiros, conhecemos uma técnica que está sendo introduzida no local. Com o intuito de tornar os ambientes dos viveiros mais abundantes, estão utilizando ‘Fisálias de pet’.

O que chocou, infelizmente mais que a beleza do lugar, foi a poluição absurda do rio. Há janelas no fundo das casas – das comunidades vizinhas, pois na Ilha de Deus há um forte trabalho de conscientização em prol da preservação do ambiente - próprias para jogar-se o lixo! E vimos acontecer, ali, ao vivo, sem contos. Navegamos pelo rio e vimos ao fundo Boa viagem e os edifícios hostis: em visual e em desigualdade econômica; em ambiente construído e desigualdade de condições, oportunidades e coisas das quais sempre ouvimos. Mas ver! E soubemos que os dejetos de lá também acabam ali, clássico das metrópoles. Soubemos também de um barco que passa fazendo a coleta de lixo, como o caminhão que conhecemos. Ficamos imaginando e mesmo assim, foi difícil crer. A completa insanidade nisso tudo, a legitimação de um hábito condenável e suicida. Pois dali vem o sustento principal da comunidade. E camarões que vão à mesa dos restaurantes e fartos banquetes dos mais favorecidos. Suicida e ilógico, se não fosse também irônico, comer o próprio lixo, num ciclo violento de péssimos hábitos. Violento por violentar-se a si, ao meio, ao outro, apenas em momentos diferentes, mas com o mesmo gesto. Enfim, vimos lixo demais e uma paisagem sendo consumida pelo crônico e clichê ato humano. Perverso. Mas vimos linda resistência do lugar, caranguejos morando em buracos de tijolos, pássaros ainda, gente interessada em cuidar, luta romântica e admirável, árvores e mangue, a natureza encontra meios de vida, ali, em qualquer lugar.


[Fisálias:Trabalho de Paulo Paes, artista plástico paraense. “fisálias de pet, um aparelho flutuante feito com garrafas de plástico, que, introduzido no mar, cria um ponto de fixação para a vida marinha. No projeto Fisálias, continentes flutuantes são utilizados plásticos de embalagens de refrigerante, onde o artista desenvolve esculturas figurativas e abstratas que são amarradas às raízes dos manguezais, onde devem ficar durante anos enquanto se integram à biodiversidade do ambiente.” Texto extraído de notícia no endereço: www.espacociencia.pe.gov.br/noticias. Para saber mais: www.fisaliasdepet.com ]

Agradecimentos à comunidade e em especial:
Diogo Tod.é, que nos apresentou o lugar e as pessoas;
Paulo Paes, que mesmo não conhecendo pessoalmente nos permitiu uma nova ciência, através de seu trabalho com as fisálias de pet;
Homero e Garotinho, que nos abriram seu lugar, mostrando lar e trabalho, que nos levaram para conhecer o mangue em seu barco e nos acrescentaram como gente, como estudiosos que são e bravos, lutando, todo dia, por um mundo melhor.


Ilha de Deus: vista aérea
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início do passeio - tod.é no comando
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primeira parada, viveiros de camarão
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Fisálias de Pet
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enquanto se espera
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Garotinho nos registros
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na maré [Homero, Garotinho e Tod.é]
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Garotinho
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Homero
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no meio de Recife
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de volta à sede do Caranguejouçá
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