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10.1.08

moléculas tropicais (07/01/08)

“(...) dias de janeiro, calor demais, dias de janeiro, olha como faz, esquenta, é tão bom estar no mar (...)” (*).

Argentina, 40˚. Assunto dos telejornais. Conversa de elevador. Desculpa para bar. Sonho de piscina. Aqui, na cidade, é permitido banhar-se nas fontes das praças. Não há brisa marinha. Não há mar. Por mais que nos valha a compleição - somos feitos de moléculas tropicais – também sentimos. E desligamos o calefon. Quem precisa de água quente? Mas cai a temperatura de repente, embora não baixe de 20˚. Todos se vão a Carlos Paz, a 57 km da capital cordobesa. Todos se vão a Mar del Plata. Ou para o Brasil. Porque os cordobeses amam o Brasil, sobretudo através da Bahia, do Rio, de Santa Catarina, pelo lugar mais argentino no Brasil, Balneário Camburiú. Muitos sabem onde fica ou ouviram falar de Fortaleza, Recife, Maceió. É verão. É inacreditável.

diciembre
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37C ST 42C
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(*) Otto, “Dias de Janeiro”, álbum “Condom Black”.
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dezembro e a ilha

Córdoba é uma cidade multicolorida: às vezes demasiada vibrante, cores ácidas, embriagantes. Em dezembro, experimentamos os tons pastéis mais deprimentes que um é capaz de enxergar. Não fossem as luzes de natal, ou por elas mesmo, sentimos o vazio; vazio pós-guerra, real do abandono, dos que ficam, do fim de festa, ainda que as festas estivessem por chegar.

Os mesmos estudantes, nossos rivais inquilinos, que vêm de todas as partes da Província pelas razoes acadêmicas, partem nesse período para suas casas, de modo a passar o natal com suas famílias. A conseqüência é da mesma devastação meteórica. Um rombo urbano; de repente estávamos sós, embora os ruídos continuassem com os mesmos absurdos decibéis, ônibus, motos e caminhões, que aceleram seus motores de modo a vencer a subida do viaduto. Às redondezas do Terminal Rodoviário, onde estamos. Óbvio, faltou aclarar esta parte. Graças à astúcia de nossos anjos cansados, mas obstinados, o universo nos brindou uma sorte. Naquele mesmo dia do “e agora?”. Da calçada para a lembrança de uma conhecida ocasional. Para uma possibilidade acenada e quase descartada, por ser mais do que creíamos necessitar. Assim, nos valia ter o teto, sobretudo neste período de desafio emocional natalino.

500w
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um eco que fica
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navidad
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[ai se foi 2007 com nosso barco de oferendas para Iemanjá pela Cañada – um canal no centro da cidade – pois quem não tem cão (...) e, ademais, há de se ser criativo. Por volta de uma do dia um, fomos os 3: Julian de Mendoza conosco, graças a engenhosidade de Julio, desceu elegantemente o barco por um cordão preso por um gancho, ate alcançar a água. E assim o vimos seguir correnteza em direção Norte. Ojala encontre o sal, a natureza bruta do Atlântico]
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Nus; polianisses e a selva imobiliária

“E agora?” Perguntamo-nos ao vento, verdadeiramente sem saída. Na rua: não era drama, a situação estava realmente periclitante. À guisa dos entendimentos: há quase um mês em Córdoba, num novo momento da expedição, buscávamos, digamos, um abrigo mais privativo. Senhoras e senhores, depois de um ano na estrada, estudando amiúde os lares, um se dá conta de suas essenciais necessidades. Um ano se passara, de trânsito e partilhas gerais. Não somos diferentes; também necessitamos da célula básica de nossas pesquisas, uma casca física onde reaver as energias. E, podemos dizer que estivemos como fênix: renascendo das cinzas, por árduos amanheceres, todos esses dias.
Em claras palavras, passamos algumas datas acolhidos por uma amiga, enquanto revirávamos o mercado imobiliário, a vivência dos mais inacreditáveis fatos. Perdas e danos: com direito a ter um colchão, que havíamos comprado de segunda mão (uma pechincha que nos havia aliviado as agruras), devorado por rotweilers. Inclusive consideramos, em momentos extremos como deste dia especifico, apelar ao seio da pátria amada salve, salve. Em seguida, recorremos mais uma vez ao HC, quando nos abrigou, por uma semana, uma gentil e também estrangeira, uma alemã ora vivente em Córdoba.

Dezembro; assim se deixa implícitas várias condicionantes. O coração mais frágil, tempo de durezas e amolecimentos, do corpo e do espírito. Não há como fugir do abismo coletivo emocional. E ainda, aos desavisados pretendentes aos alugueis cordobeses, um agravante: a especulação imobiliária selvagem. Jamais vista. Em Novembro e Dezembro, quando a cidade recebe a primeira ola de estudiantes e em Fevereiro, com a segunda, são os períodos mais dramáticos. A ponto de ser anunciado um imóvel pela manhã e estar ocupado já pela tarde. Chegamos, inclusive a ver apartamentos com mais dez interessados, num ensandecido salve quem tiver melhores garantias ou mais rápido gatilho para reservá-lo. Não há misericórdia. Demanda estudo cientifico, ai vai uma sugestão.

Pois bem, ao relento: “e agora?”. Depois de todo tipo de violação da dignidade, mais uma dura provação. Estar na rua é, sem adjetivações, estar nu. Nu, de roupas, mas nu: espartanos sem escudos, levando tiros de olhos e de qualquer natureza de projetil. Suportar ‘Polianisses’; já não é inverno. E, ademais, estar seguro de que uma condição sempre pode piorar. Enfim, o clima nos brindara um cenário mais ameno, embora, vez e outra, nos sabotasse as investidas com chuvas e toda qualidade de evento cósmico, de vendaval a granizo. Chegamos à conclusão de que, sim, Otto tem razão. Só não caímos porque somos nordestinos e bem alimentados. Com todo respeito aos demais compatriotas: evocamos o Severino e de cócoras refizemos o latino americano. Porque não é qualquer veia que pode com este sangue.

grande biu
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internos
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externos
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[agradecemos]

- a Victoria, por nos receber em sua casa por duas semanas e meia, periodo decisivo para nosso futuro e, sobretudo, porque nos fez mais fortes;
- a Martin Miguel, quantas vezes podermos gritar ao mundo, por tudo que nos fez, principalmente porque é dos amigos mais especiais que a América do Sul nos presenteou;
- a Martin Bettiol, pela decisiva ajuda, pelo carinho, pela amizade que se afirmou;
- a Verónica Palma, pelo coração aberto, desde o dia em que nos conhecemos, pela essencial contribuição, por todas suas delicadezas;
- a Ignacio, por compartilhar as dores e por prometer compartilhar tambem as alegrias futuramente;
- a Theresa, por nos abrigar e nos conduzir à solução de todos os nossos problemas;
- a Fernanda, por nos estender a mao num dos dias mais difíceis de toda a viagem e nos brindar com sua amizade;
- a D. Pilar, pela existência de Fernanda, pela compreensão, pela sensibilidade, pela decência que demonstrou sempre;
- ao Santiago e ao Oscar, pela ilha que representaram em nossa passagem, pelo interesse, franqueza e fineza incontestáveis;
- aos queridos todos que de maneira fundamental a nossa sobrevivência dos últimos dias contribuiram direta ou indiretamente.
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