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3.4.07

domingo de Liberdade e Luz (04/02/07)

[A cidade modifica o homem? Ou isso é determinismo geográfico?]

Cair na escala da casa foi ver primeiro o íntimo de uma condição urbana. A gente sentiu algo diferente. Completamente particular, mesmo que tenhamos crescido em capitais, o imaginário não acompanhou o real. Fomos traídos pela teoria: estar ali representou estar, assim como os repórteres de campo, estar, categoricamente, na hora e no lugar. Sentir estar onde tudo acontece.

Assim, foi saudável sair da casa para a rua. Ver de fora, de onde vem. Ver o macro depois do micro, ver a cidade e seus códigos. Tentar compreender a trama – estaríamos num arquétipo? Ou numa ilustração de doutorado? Reality show para psiquiatria? Ir ao tempo da máquina, sentir um pouco a engrenagem, nem que fosse num dia de domingo. E melhor assim. Mais sadio e gradual, afinal segunda-feira é um dia oficial de loucura.

E foi domingo na Liberdade. Bairro oriental, taxativo, de iluminação e detalhes, culinária e cenário. Depois, foi o começo de um padrão: caminhar é o melhor jeito de locomover-se na cidade. Deslocamos por longos passos, pelo menos mais que o de nosso hábito. Passamos perto dos estereótipos e das paisagens televisivas. Dos jornais. Das aulas da faculdade de arquitetura. Da ‘cracolândia’ à Estação da Luz. Depois de metrô. Depois já rápidos demais para a nossa natureza.

de liberdade
konidomo

encantamentos [Raquel e Lívia]
konidomo

de luz
konidomo

circular
konidomo


[Pensamentos soltos pelo caminho]

acerca do Metrofor(*): quando na escola de arquitetura, imaginávamos chegar a usá-lo, algum dia, ainda estudantes. E vimos tão distante, não consta em nosso imaginário de cidade;

acerca da dinâmica: a presença das tecnologias, incorporada pela população de forma incrivelmente natural. Uma senhora sexagenária, na linha azul, de ticket na mão, muito mais a vontade no manuseio que nós. Reproduzo em pensamento nossas avós: desenvoltura no pau-de-arara, artimanha na produção de chapéu de palha, feitio de queijo, cozinha, faxina, agilidade para matar o bicho para o almoço, pescoço de galinha em punho, natural... Andar de metrô? Passar o ticket no leitor?

acerca do indivíduo: expressões estéticas, todas as diferenças banalizadas? A força do anonimato é absurda, mas também é humano ser indivíduo. Na massa da multidão, é efetivo o desejo de ser elemento? De ser único, embora misturado e filho dessa organização social? Ser casca e ser quilo? Ou ser grão e ser profundo? O normal é ser diferente ou é diferente ter um aspecto padrão, reproduzido em outros lugares do país?

(*) Sistema de Metrôs de Fortaleza, não sabemos qual o status da obra, mas ainda não fora finalizado e há muito tempo iniciado.

o traçado
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[o tom do normal]

Anonimato é segurança. Pertencer à multidão. Andar e respirar na mesma freqüência. É mimese. Estar em outra sintonia, explícito, é estar nu, ou ser filé em canil. Exagero? Talvez. Fruto do mesmo imaginário. O susto ou o surto de a qualquer momento vir o caos. Tensão permanente. O tom do normal é um alento, esforço para a manutenção de uma ordem importante. A ordem da sobrevivência. Como empate entre flamengo e botafogo no Maracanã. Necessário. E não se pode parar, São Paulo é mesmo movimento. Bobagens? Senso comum? Talvez. Mas na hora do pânico, não importa se o terror é folclore, provinciano, falta de ‘hábito São Paulo’. A regra do instinto é permanecer vivo.

Todavia, se por um lado ser diferente às vezes é arriscar atenção, poder ser alvo fácil, por ironia e discrepância, também representa uma forma de sobrevivência. Ser gente, sentir-se indivíduo, único, materializado por um grito estético. Adereços e provocações. E na Consolação, sentimos a permissão do passeio anônimo, na mesma medida da excentricidade de nossas formas, nossa natureza, até de madrugada.

normal
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[hábitos]
Foi a primeira vez que entramos em um bingo. E foi na Augusta, aquele ambiente clássico, senhoras solteiras, caldo servido por um garçom não mais glamouroso, meio domingo fim de tarde. Ir ao bingo é um estudo urbano: as cores do bairro, botas e decotes, pouco oxigênio, o cheio parado, cabeça correndo. Depois, naqueles lugares típicos de São Paulo, botequins de café da manhã, clássico, eis que estávamos no 633. É o número, não o nome; bom até para um queijo quente.



633 [Raquel.Mirela e Lívia]
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